segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Parecer - simplificação do reg. predial e actos notariais

ANTEPROJECTO DE DECRETO-LEI QUE PROCEDE À SIMPLIFICAÇÃO DO REGISTO PREDIAL E DOS ACTOS NOTARIAIS CONEXOS P A R E C E RI – SÍNTESE DAS ALTERAÇÕES PROJECTADAS1. Foram pedidos os comentários do Gabinete de Estudos da Ordem dos Advogados sobre o anteprojecto de Decreto-Lei que “Procede à simplificação do registo predial e dos actos notariais conexos”.2. Se bem entendemos, o anteprojecto recebido corresponde ao texto articulado da reforma anunciada por Sua Excelências o Ministro da Justiça e o Secretário de Estado da Justiça, em 19.2.2008, e integrada no programa SIMPLEX e no Plano Tecnológico, tendo em vista a simplificação do registo predial e actos notariais conexos.3. Nessa data, foram anunciados os grandes objectivos da reforma a introduzir, até Julho ou Dezembro de 2008, que são quatro:1.º Criar balcões únicos, para eliminar deslocações, reduzindo custos;2.º Simplificar actos e processos e eliminar formalidades desnecessárias, com mais segurança;3.º Criar novos serviços on-line;4.º Criar preços claros transparentes.4. O Balcão único “Casa Pronta” permite a realização imediata de todas as operações necessárias à transmissão de um imóvel num único posto de atendimento, nos serviços de registo: a celebração do contrato por documento particular, a realização imediata dos registos, o pagamento de impostos (ex.: IMT), a verificação das licenças camarárias, o pedido de dispensa do IMI e o pedido de alteração da morada fiscal.5. Pretende-se eliminar a obrigatoriedade de escrituras públicas, para pôr termo ao sistema, actualmente em vigor, de duplo controlo pelo notário e pelo conservador do registo predial. A escritura pública passará a ser facultativa, permitindo-se a celebração dos actos por documento particular autenticado. Prevê-se a promoção obrigatória dos registos, informatizados e em rede telemática, permitindo que os actos sejam praticados junto de 5 entidades: serviços de registo/conservatórias, advogados, câmara de comércio e indústria, cartórios notariais e solicitadores.6. Acabará a limitação da competência das conservatórias ao território do local onde se situam, podendo os interessados dirigir-se a qualquer delas para promover o registo no sistema.7. No balcão único poderão ser praticados, entre outros, os seguintes actos: compras e vendas de imóveis, hipotecas, doações, partilhas, contratos-promessa com eficácia real, pactos de preferência, constituição e modificação de propriedade horizontal e de direitos de habitação periódica, divisões de coisas comuns, mútuos.8. Deixará de ser necessário aos interessados apresentar certidões de documentos, que estejam disponíveis no próprio sistema – e muitos passarão a estar: não só documentos das conservatórias e notários, mas de outros serviços da Administração Pública Central e Local (incluindo, por exemplo, alvarás de loteamento).9. Pretende-se a eliminação de registos desnecessários, considerando-se como tais os “registos intermédios”. Nomeadamente, no caso de falecer o dono de um prédio e os herdeiros quiserem vendê-lo ou partilhá-lo, deixa de ser necessário registá-lo em nome dos herdeiros, podendo registá-lo directamente em nome do comprador ou adquirente na partilha.10. Impõe-se a obrigatoriedade directa do registo predial, para evitar a desactualização dos registos que, hoje, se verifica, bem como para harmonizar o registo predial com as matrizes prediais (dos Serviços de Finanças).11. Permite-se o pedido on-line de actos de registos, bem como a obtenção de certidões on-line.12. Criam-se novos serviços com valor acrescentado: a conservatória ou serviço de registo passa a obter documentos de outros serviços da Administração Pública para os interessados.13. Com o novo regime de suprimento de deficiências do pedido de registo, a conservatória ou serviço de registo poderá resolver mais problemas e evitar a recusa do pedido.
II – COMENTÁRIOS AO ANTEPROJECTOA) NA GENERALIDADE14. Na generalidade, as alterações projectadas são de aplaudir, na medida em que possibilitam a simplificação de formalidades, permitem alcançar maior rapidez, redução de custos e deslocações e, nalguns aspectos, mais segurança – à semelhança do que está a ser praticado no âmbito do registo comercial (v. g., com o sistema da empresa na hora e da empresa on-line).15. Parece-nos, sobretudo, de salientar a importância da actualização e harmonização do registo predial com as matrizes prediais (art. 28.º e 29.º do CRPred), enquanto não for possível eliminar estas – o que nos parece desejável.16. O anteprojecto suscita-nos, todavia, uma objecção e uma preocupação importantes.17. A objecção refere-se ao que o Ministério chama eliminação de registos desnecessários (acima mencionados), porque ela equivale, em relação a esses registos, ao fim do princípio trato sucessivo, que tem sido um dos princípios mais importantes do registo predial.18. Entendemos que tais registos são necessários para facilitar a quem consulta o registo a reconstituição da série de factos que está na origem da situação actual. Isso é frequentemente preciso, para verificar a regularidade de transmissões eventualmente viciadas, que sejam de impugnar. Por outras palavras, a eliminação desses registos intermédios dificultará aos eventuais interessados a determinação do modo como foi adquirido o direito dos transmitentes.19. Por outro lado, a realização de tais registos intermédios só será complicada – a ponto de “justificar” a sua eliminação -, caso a conservatória não controle devidamente as transmissões intermédias. Porque, se as controlar, é relativamente fácil registá-las.20. Por outras palavras, a eliminação dos registos intermédios não é, verdadeiramente, necessária e pode ter graves inconvenientes, por promover ligeireza na verificação dos factos respectivos, o que poderá suscitar abusos, que podem ser muito gravosos para os interessados.21. Por isso, entendemos que a chamada eliminação dos registos intermédios deve ser eliminada, mantendo-se em vigor o princípio do trato sucessivo.22. A preocupação refere-se ao problema do controlo dos actos sujeitos a registo. Desde o início dos trabalhos da Comissão para a Desformalização, foi criticado o duplo controlo – pelos notários e pelos conservadores – tendo o Governo optado por eliminar o controlo pelos notários, mediante a revogação da necessidade de escrituras públicas para uma série de actos, v. g., no âmbito das sociedades comerciais.23. O modo como esta reforma tem vindo a ser concretizada leva-nos a recear, todavia, que, eliminado o controlo pelos notários, não esteja tão pouco a ser suficientemente efectuado o controlo pelos conservadores – sobretudo, em relação a actos que apenas são registados mediante depósito, sem que haja uma inscrição ou averbamento no sistema. A confirmar-se este receio e a sua divulgação, o número de abusos poderá aumentar muito, comprometendo a segurança jurídica em sectores muito sensíveis e conduzindo a um aumento dos processos judiciais.B) NA ESPECIALIDADE24. Por ser escasso o tempo disponível, vamos limitar os nossos comentários, na especialidade, aos pontos que nos merecem críticas ou sugestões de aperfeiçoamento.25. Em consequência lógica do exposto acima, parece-nos que, na projectada alínea a) do n.º 2 do art. 9.º do Código do Registo Predial (CRPred), deve ser eliminada a referência à partilha.26. Por igual motivo, deverá ser adaptada a redacção dos projectados art. 34.º, n.os 2 e 3, e 35.º do CRPred, bem como eliminados os n.os ii) e iii) da alínea a) do n.º 1 do art. 8.º-A a aditar ao CRPred, e ainda adaptados os projectados art. 54.º, n.º 4, e 55.º, alínea a), do Código do Notariado.27. Uma vez que o registo predial passa a ser a única ocasião em que se efectua o controlo de legalidade dos actos a ele sujeitos (podendo ser dispensado ou aligeirado o controlo do notário), parece-nos importante assegurar que esse controlo seja feito por um conservador. Por isso, a eliminação da expressão inicial do art. 68.º do CRPred “compete ao conservador apreciar a legalidade”, parece-nos inconveniente – assim como nos parece excessivamente longa a lista de actos que, segundo o n.º 2 do art. 75.º-A, a aditar, passarão a poder ser feitos por oficiais dos registos. Admitimos que o conservador delegue, quando verifique, caso a caso, que os oficiais de registo são suficientemente capazes, mantendo aquele o controlo e a responsabilidade pelo que é feito.28. No projectado art. 111.º, n.º 1, do CRPred, deve admitir-se também a possibilidade de o pedido ser apresentado por meio electrónico – à semelhança do que prevê o art. 41.º-B a aditar.29. Parece-nos inconveniente a revogação do n.º 1 do art. 117.º-G do CRPred, pois é importante a citação do Ministério Público para defesa de eventuais interesses do Estado e de outras pessoas cujos interesses lhe caiba assegurar.30. Permitimo-nos chamar a atenção para alguns erros de ortografia e gramática:a) No projectado art. 33.º, n.º 1, 4.ª linha, onde se lê “no caso dessa”, deve ler-se “no caso de essa”;b) No projectado art. 38.º, n.º 1, 1.ª linha, onde se lê “Salvo quando se tratem de factos”, deve ler-se “Salvo quando se trate de factos”;c) No projectado art. 54.º, 1.ª linha, onde se lê “alterações, são”, deve ler-se “alterações são” (não deve haver vírgula entre o sujeito e o predicado);d) No projectado art. 92, n.º 3, 5.ª linha, onde se lê “emitido com a antecedência não superior”, deve ler-se “emitido com antecedência não superior”.31. Nos projectados art. 110.º, n.º 3 e 5, 117.º-G, n.º 7, 117.º-H, n.º 7, 41.º-C, 90.º-A, 153.º-A do CRPred, entre outros, sugerimos que a expressão “membro do Governo responsável pela área da justiça” seja sempre substituída por “Ministro da Justiça” – por facilidade de identificação e leitura e para economizar papel, tinta e tempo (usando três palavras em vez de oito). Obviamente, isso não deve impedir a delegação, nos termos gerais. Esta sugestão vale, aliás, para a generalidade das leis.Salvo melhor opinião.Lisboa, 2 de Abril de 2008O Relator,Luís Brito CorreiaO Presidente do Gabinete de Estudos,Germano Marques da Silva
in www.oa.pt

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